por
Alan Frick
graduando em Filosofia
pela UFPA
Conselheiro
Universitário Discente da UFPA
Ex-Conselheiro
Universitário Discente pela UFF
Ex-presidente da UEE-RJ
(União Estadual dos Estudantes do Rio de Janeiro)
Ex- vice presidente RJ da UNE ( União Nacional dos Estudantes)
Depois de uma discussão com uma
professora, chamada Verônica (FILOSOFIA UFPA), em sala aula, me inspirei a
escrever este texto. Esta, em um de seus muitos momentos de infelicidade
pedagógica, no ensino de práticas pedagógicas para professores de filosofia,
parou a aula. Antes de passar um vídeo sobre a história de um templo com
esculturas tântricas na Índia, disse estar feliz porque o ANDES havia decidido
iniciar um movimento grevista nacional: "temos de aproveitar o momento de
fragilidade do governo para desgastá-lo ainda mais". Por motivos óbvios pedi
a palavra, prontamente negada, mas não antes que eu dissesse considerar esta
postura um abuso de seu poder professoral do discurso, levantando uma questão polêmica
sem oportunizar o contraditório. Esta retrucou, dizendo que eu era grande
demais e minha voz muito alta. Pela lógica anões e crianças deveriam ter
imunidade parlamentar.
Mas
entrando no que me proponho a tratar, este movimento grevista anunciado pela
educadora:
Uma
greve significa, em termos de senso comum, uma paralisação de trabalhadores com
vistas a um fim, normalmente, salarial. Existem outros tipos de greve, como
políticas, com o objetivo de desestabilizar ou mudar mandatários, em geral
conduzidas por várias categorias e locais geográficos distintos. Existem as
greves de estudantis que lutam por melhores condições de aula, ou transporte,
ou outras dezenas de exemplos da mesma natureza. Ainda existem greves de fome em
que apela-se para o emocional de uma ou mais pessoas, ou greves íntimas, caso
que os cônjuges conhecem bem o significado.
O que
fica claro aqui é que a greve não é um ente desprovido de contexto ou motivos,
sendo, portanto, um instrumento de luta, que pode servir a diferentes
segmentos ou classes sociais, ou ainda
com naturezas ideológicas distintas. A Greve do Porto de Santos, quando os
trabalhadores, liderados pelo partido comunista, recusaram-se a carregar os
navios de café, que seguiriam para o abastecimento do Regime Franquista na
Espanha, ou ainda, em outro extremo, a greve dos engenheiros da PDVSA, em 2002,
quando houve uma das diversas tentativas da direita venezuelana desestabilizar
o governo e a liderança de Hugo Chávez.
Estes
dois últimos parágrafos servem para desarmar os imbecis esquerdistas, que
provavelmente me chamarão por alcunhas pejorativas por escrever este texto. A
greve não é boa ou má, positiva ou negativa, de luta ou pelega, por natureza, depende
de suas razões, de seus agentes, mas, repito, a greve é um, e quero frisar este
artigo "um", dos instrumentos disponíveis para a classe trabalhadora,
na busca de seus legítimos interesses.
Durante
o Governo de Fernando Henrique Cardoso, a universidade pública brasileira,
assim como o restante da máquina administrativa, ficou em xeque. O melhor,
segundo o pensamento neoliberal, seria liberar para as regras de mercado boa
parte das tarefas que, historicamente, foram desempenhadas pelo estado.
Assuntos como saúde, educação, comunicação, transportes e geração de energia, estratégicos para qualquer país, seriam
melhor executados, como políticas públicas, se feitos por particulares, com o
acompanhamento de entes supra estatais (agências reguladoras), que agiriam
quando o mercado não desse conta de regular tudo. E assim ficou sustentada
ideologicamente, no Brasil, e em boa
parte de nosso continente, a sanha privatizadora.
Este
período acabou com a vitória das forças progressistas lideradas por Lula, que
estabeleceu uma ordem diferenciada na perspectiva educacional, vista pelos
tucanos como gastos e esforço estatal desnecessário, passando a ser encarada
como investimento. O que antes eram ataques e processos privatizadores, foi
substituído por repasses regulares e contratação de mais técnicos e
professores. O que antes eram as nomeações de interventores não eleitos pelas
comunidades universitárias, passou a ser o respeito à democracia interna destas
instituições. O que antes era o ataque à faceta pública, com a ideia de que
quem estudava nas universidades públicas seriam setores privilegiados da
sociedade, e que estes poderiam (e deveriam) pagar por este estudo, passou à implementação de políticas públicas
de cotas, para estudantes de escolas públicas, negros e índios, mudando a cara
do ensino público superior brasileiro, ampliando e pluralizando o acesso. O que
antes era um mar anárquico de concepções e objetivos, passou a ter foco, com a
Reforma Universitária e o REUNI.
Foram
criadas mais de uma dezena de novas universidades, dezenas de centros técnicos
de ensino, foram ampliadas e interiorizadas as vagas nestas instituições,
fortalecendo o desenvolvimento regional e democratizando o acesso ao ensino
superior.
Estas
instituições passaram a ter mais influência social, com um ganho maior de
autonomia, enriquecendo sua atividade
fim, com um entrelaçamento cada vez maior entre os setores da sociedade
(público e privado) e os produtos das pesquisas e ações extensionistas. Os
muros diminuíram, objetiva e subjetivamente. O número de pós-doutores, doutores
e mestres cresceu vertiginosamente, assim como a quantidade e a qualidade de cursos de pós-graduação. A
relação das IFES com seus pares, dentro e fora do país, através de programas
federais, através de acordos e convênios, permitiram um novo conjunto de possibilidades, aumentando, ainda mais, a imagem positiva que conseguimos ganhar de nosso país, dentro e fora das linhas de fronteira.
Portanto,
parto do pressuposto que temos um governo que valoriza o ensino público,
gratuito e de qualidade, pelos fatos enumerados anteriormente.
Ademais,
precisamos avaliar, já que a greve é um instrumento, a conveniência da mesma.
Esta, sem dúvida, está ligada a um balanço de prós e contras, levando em conta
o conjunto dos envolvidos por esta. No caso, uma greve na universidade tem
algumas características interessantes, que merecem ser iluminadas para que nada
se perca nesse raciocínio.
Em
primeiro lugar, uma universidade não tem uma compleição típica fabril, em que
um conjunto de pessoas trabalha para um patrão pessoal ou impessoal, produzindo
mais valia, objeto do empreendimento capitalista. Sem força de trabalho o
patrão é obrigado a negociar, com toda a complexidade política e jurídica que isso
significa nos dias de hoje em nosso país, que possui um número grande de regras
para essa situação. Numa repartição pública usual, esta paralisação também tem
um conjunto de trabalhadores que param de produzir, neste caso serviços,
prejudicando uma relação entre usuários e estado. Nesse segundo caso, em geral,
uma parte desses serviços precisam ser garantidos, pois do contrário pessoas
morreriam (caso da saúde), ou catástrofes sociais poderiam acontecer (caso da
segurança ou transportes). Mas
não quero entrar no mérito deste segundo tipo, pois meu objetivo aqui é
entender melhor o que se passa quando da conflagração de uma greve na
Universidade Pública. Este ente diferenciado, a Instituição Pública de Ensino
Superior, não tem uma relação entre usuários e estado, pelo menos não
predominante. Uma IFES é composta por três segmentos: estudantes, professores e
técnicos. Os estudantes têm aulas, os professores ensinam e os técnicos cuidam
das tarefas operacionais, mas os professores e técnicos também estudam e os estudantes
ajudam na execução das outras tarefas, como jovens pesquisadores, ou ainda como
extensionistas, compondo um sistema, que serve aos interesses mais gerais de suas localidades e do Brasil, e, todos juntos, elegem juntos seus internos e ainda
discutem os temas de maior relevância, através dos colegiados de Institutos e
conselhos superiores. O interesse em que esse conjunto de situações e projetos
continuem se dando é absolutamente difuso, mas existe, como uma vontade clara
da sociedade brasileira em ser cada vez mais capaz de produzir tecnologias, ou
mesmo de se entender, ou ainda, e não menos importante, construir o processo de
educação dos seus.
Ora,
mesmo muito importante, esta vontade social não tem corpo, muito menos sabe
verbalizar em português. Ela manifesta-se de diferentes formas, em geral quando
os prejuízos vão sucedendo-se. Vamos, portanto, identificar quais são esses:
O
primeiro problema me parece ser a confusão que é criada, do ponto de vista de
calendário. Como essas greves, em geral, são muito longas, e se iniciam nos
primeiros meses do semestre, acaba comprometendo o mesmo. Não existe uma forma única
de tratamento da questão por parte dos professores, que criam as mais diversas
maneiras de repor as aulas perdidas (quando são), em geral utilizando horários
diferentes e finais de semana, ou quase sempre, as férias. Portanto, além do
atraso na conclusão do curso, a bagunça criada na vida de todos, o conteúdo
deste fica comprometido, pelo menos em parte, sendo este, o segundo prejuízo.
O
terceiro problema é que a universidade não se resume à graduação, causando um
problema concreto, além de uma contradição: a parte extensionista da
universidade, boa parte dela, presta atendimento para setores da sociedade, boa
parte destes carentes. Fica claro que este produto da greve é absolutamente
negativo. E, ainda neste Gera também um outro problema, muito grave, em outro
campo: Boa parte dos projetos têm prazo, que não leva as greves em conta.
Com a
mesma argumentação, falo da pesquisa. Estes projetos não podem parar, porque as
bolsas têm prazo, os cursos de pós-graduação têm prazos e responsabilidades, e
o não cumprimento destes gera consequências objetivas. Portanto a graduação
para, mas a pós não. A única razão que consigo enxergar é que, para os que
defendem a greve como instrumento banalizado de luta política dentro da
universidade, a graduação é de uma categoria diferente da pós, para pior, é
claro. Esse sentimento de que a graduação é sacrificável e a pós não, mesmo que
este assunto seja escamoteado, é uma hipocrisia de grande monta.
Terceira
questão é a falta de legitimidade das entidades, no geral, para liderar este
tipo de iniciativa. No caso da ADUFPA (Associação de Docentes da Universidade
Federal do Pará), a assembleia que decidiu tirar um indicativo de greve tinha
18 presentes, dentre estes alguns professores que foram menos motivados em
participar e mais de observar, de um total aproximado de dois mil. Isso é
absolutamente absurdo, e mais, no caso de uma universidade como a em questão,
com mais de 10 campi de ensino presencial, a discussão não deveria ficar
circunscrita ao Campus do Belém, como corriqueiramente acontece. Uma discussão
mais profunda e democrática deveria acontecer, talvez avançando para um
plebiscito, entre os docentes, para a deliberação sobre o tema. A favor, ou
contra, a decisão teria mais força,
seria menos subterrânea.
Mesmo
com todos estes problemas, acredito haver momentos em que a greve se
justifique, mas só em momentos muito críticos, com ampla mobilização e
legitimidade, no caso de uma categoria, mas, mais corretamente, quando houvesse
uma pauta única de reivindicação, que mobilizasse os três setores
constitutivos, com solidariedade e cumplicidade entre estes, o que não costuma
acontecer. Entre os técnicos e docentes, quando uma negociação avança para uma das
duas categorias, esta volta às suas atividades esquecendo os que não foram atendidos,
mostrando um pragmatismo econômico bem diferente do costumeiro discurso, sempre
feito por brados politicamente corretos e com pouquíssima correspondência com o
que costumamos chamar de realidade (com todos os senões filosóficos que tal
palavra suscita).
Mais uma
contradição, se a greve, de fato, fosse uma forma de mobilização de pessoas que
lutariam ao invés de trabalhar, talvez desse certo, mas não é o que acontece. A
Universidade fica vazia, e estas pessoas, no caso professores, em geral
aproveitam o tempo para dedicar-se a outros assuntos. Ficam as vanguardas, e
olhe lá!
Os
estudantes dos partidos ligados aos partidos dirigentes destes sindicatos, boa
parte deles do PSOL e PSTU, elaboram, sempre afetadamente, uma pauta de reivindicações
que é celebrada, também afetadamente como pauta conjunta. E estes ficam com
cara de tacho quando, sem nem ao menos uma satisfação, a categoria volta às
aulas e as tais demandas ficam no esquecimento, colocando o movimento estudantil
numa incômoda posição, que essa turma aceita tranquilamente, como bois guiados
por sertanejos. Ficam na universidade, portanto, a vanguarda dos professores, fingindo
que há pauta conjunta e a dos estudantes, fingindo que acreditam. Ridículo!
Parte
dos que estão lendo esse texto, imbecis esquerdistas, devem estar xingando
minha oitava geração, amaldiçoando os que viabilizaram geneticamente a vinda de
tamanho pelego à Terra. Ora, imbecis, meu único princípio é a Revolução
Socialista, nenhum instrumento de luta me apetece em particular. Esse não é o
ponto!
Mas
acredito que existem outras formas de manifestação muito mais contundentes, no
apelo à tal "Opinião Pública", para criar um clima de solidariedade
aos temas que estão gerando o litígio, como por exemplo, a ocupação de todos os
órgãos federais do país. Em aula, as universidades, quando convencidas da importância
do tema, são capazes de fazer isso, mas dá trabalho. Isso sim obrigaria o
Governo Federal a negociar. As redes sociais, se bem utilizadas,podem cumprir
um papel muito mais impactante que uma lenta e dolorosa greve de 3 ou 5 meses.
O
problema é que os sindicatos se acostumaram a prescindir de outros
instrumentos, derivado de um claro distanciamento de suas bases, mas,
principalmente, por preguiça e falta de criatividade. Com todo o respeito a
estes, a universidade brasileira é muito importante para ficar a mercê de
tamanha incompetência e esquerdismo.
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